quinta-feira, 13 de março de 2014

O Estranho chegou e instalou-se...

   Alguns anos depois que nasci, o meu pai conheceu um estranho. Desde o princípio, o meu pai ficou fascinado com este encantador personagem, e convidou-o a viver com a nossa família! O estranho aceitou e, desde então, tem estado connosco.

   Enquanto eu crescia, nunca me perguntei sobre o seu lugar na minha família; na minha mente jovem, já tinha um lugar muito especial. Os meus pais eram instrutores complementares: a minha mãe ensinou-me o que era bom e o que era mau, o meu pai ensinou-me a obedecer... mas o estranho é que era o nosso narrador. Mantinha-nos enfeitiçados por horas com aventuras, mistérios e comédias. Ele tinha sempre resposta para qualquer coisa que quiséssemos saber de política, história ou ciência. Conhecia tudo do passado, do presente e até podia predizer o futuro! Levou a minha família ao primeiro jogo de futebol. Fazia-me rir e fazia-me chorar.

   O estranho nunca parava de falar, mas o meu pai não se importava. O meu pai dirigia nosso lar com certas convicções morais, mas o estranho nunca se sentia obrigado a honrá-las. As blasfémias, os palavrões, por exemplo, não eram permitidos em nossa casa… Mas, o estranho usava, sem problemas, a sua linguagem inapropriada que, às vezes, queimava os meus ouvidos e que fazia o meu pai retorcer-se e a minha mãe ruborizar-se.

   O meu pai nunca nos deu permissão para tomar álcool. Mas o estranho animou-nos a tentar e a fazê-lo regularmente. Fez com que o cigarro parecesse fresco e inofensivo, e que os charutos e cachimbos fossem distintos. Falava livremente (talvez demasiado) sobre sexo. Os seus comentários eram, às vezes, evidentes, outras sugestivos, mas sempre vergonhosos. Agora sei que os meus conceitos sobre relações foram influenciados fortemente, na minha adolescência, pelo estranho.

   Repetidas vezes o criticaram, mas ele nunca fez caso e, mesmo assim, permaneceu no nosso lar. Passaram-se já muitos anos desde que o estranho veio para nossa família. Desde então, mudou muito: já não é tão fascinante como era ao princípio. Mesmo assim, quem, ainda  hoje, entrar na casa dos meus pais, lá o encontra sentado no seu canto, esperando que alguém queira escutar as suas conversas ou dedicar o seu tempo livre a fazer-lhe companhia...

   O seu nome? Televisor... E agora ele tem uma esposa que se chama Internet e um filho irrequieto que se chama Telemóvel!
   (Agora, releia e medite!...)

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